Thursday, 2 April 2009

Parte I.

No coração da bela Lisboa, numa rua típica e nada extraordinária, vivem lisboetas, como é de se esperar.

Igual a muitas outras ruas da nossa capital, esta é pequena e habitada por prédios compostos de fachadas de várias cores e épocas. A calçada do passeio é desigual e já lhe faltam umas quantas pedras, a mercearia que forma a esquina irradia cheiro familiar, um misto de couves e lixívia. Na outra ponta, chinelos, flores falsas e brinquedos de plástico decoram a montra da loja dos chineses, mais uma...poderia dizer o que acho disso mas fica para outra altura.

As personagens desta rua representam o que é a população da nossa cidade, velhos, novos, amarelos, brancos, democratas, monarcas, enfim o mais significante é que se vive ali uma paz.

Do quarto andar, sem elevador, a janela do meu quarto esta ao nível da janela do vizinho que habita o mesmo piso do outro lado da rua, a estrada é estreita e assim a proximidade garante uma boa visibilidade da vida caseira uns dos outros. Não sou uma pessoa naturalmente cusca, se observo é pelo um fascínio quase sociológico, de ver o humano no seu habitat, como ver filmagens dos leões da selva na televisão.

Este vizinho, não sei o nome dele, é novo, se ainda não os tem, deve estar perto dos trinta. Fisicamente é imperfeito, o que o torna aos meus olhos, belo. Tem daqueles narizes que pode ser considerado inestéticos, não é especialmente grande mas é torto. Os seus olhos são escuros, quase negros, o que os torna misteriosos, as emoções que possam sentir quase imperceptíveis ao observador. É magro mas tem as costas largas e a sua considerável altura faz com que ande meio inclinado.

À noite encosta-se à janela e fuma, às vezes dois ou três cigarros de seguida. Não sei para onde olha, mas também não me parece que esteja a ver coisa que esteja fora da sua imaginação. São poucas as noites em que chega a casa sozinho, mas acába-las sempre assim, a fumar o seu cigarro. Embora entretenha estas muitas visitas, ao final da noite parece-me só.

3 comments:

A. said...

Estás cada vez melhor nisto! :)

Para além de tantos outros, mais um talento. A escrita.

Consegui ver tudo tão bem... :)

mmmm.. dps tens de me falar do teu vizinho... acho q nao o devias deixar assim sozinho! :P

Beijoooooos

Ana said...

tenho por certo que a solidão é un estado de espirito e não um fenomeno fisico. ( tirando a infelicidade dos casos tb na nossa linda lisboa da solidão dos idosos abandonados )

mas voltando ao teu post...
Por vezes basta saber que alguem realmente importante está a pensar em nós para não nos sentirmos sós; e podemos cheios de gente que não interessa e sentirmo-nos mais sós que nunca.

JR said...

A primeira reacção, é realmente pensar em cusquice, já que tal foi descartado, resta a parte "sociológica" e aqui como se encaixa a Juicy??

Como predadora do predador?

Ou eventual predada de um eventual predador que fuma um cigarro a modos de digestivo após digerir as suas presas.

E ele? tem pinta de predador? ou simplesmente compra caça?